Nos últimos anos, tem se observado um crescente interesse pelo uso das técnicas de estimulação cerebral não invasiva (ECNI) como intervenções dirigidas à melhoria cognitiva, à manutenção da cognição ou à diminuição da progressão das alterações cognitivas relacionadas com a idade.
Nos últimos anos, a estimulação transcraniana com corrente alternada (tACS) tem ganho cada vez mais atenção por parte da comunidade científica, como um método seguro e eficaz para melhorar a cognição e modificar a progressão das demências.
A tACS utiliza uma corrente sinusoidal, que permite alterar as oscilações corticais e sincronizá-las para modular a atividade rítmica que sustenta os processos cognitivos. Em particular, a atividade cerebral gama (∼25-100 Hz) é conhecida pelo seu papel na função cognitiva, na qual se inclui a memória, e é fundamental para uma atividade cerebral saudável e para a comunicação intracerebral, induzindo um aumento desta atividade, beneficiando assim a cognição.
A apoiar esta ideia, uma recente revisão sistemática e meta-análise1 revelou que a aplicação de protocolos tACS no córtex parietal posterior melhorou significativamente as funções executivas e as funções perceptivo-motoras em adultos jovens saudáveis. Em estudos anteriores, também se observaram melhorias na memória de trabalho auditivo-verbal e na memória a longo prazo em adultos com mais de 65 anos saudáveis2.
Evidências mais recentes, de uma meta-análise que envolveu mais de 100 estudos sobre estimulação elétrica transcraniana, demonstrou que aplicação de tACS gama em participantes saudáveis e em Pessoas com patologia neuropsiquiátrica (Depressão, Doença de Parkinson ou adição de substâncias) traduz-se em melhorias na capacidade de atenção, na memória a longo prazo, na memória de trabalho, na capacidade de processar novas informações e na resolução de problemas3.
Da mesma forma, também se investigou a aplicação de tACS gama no córtex parietal, em particular, no pré-cúneos, para restaurar a função dos circuitos de memória da rede posterior em doenças que afetam a memória, como a Doença de Alzheimer. Num ensaio experimental pioneiro, em ratos transgénicos (5XFAD), que imitam a Doença de Alzheimer, utilizando estimulação gama foi possível induzir uma resposta neuroprotetora, reduzindo a carga de proteína amiloide (marcador da Doença de Alzheimer em humanos), indicando, assim que, a estimulação tACS gama pode proporcionar um amplo espectro de efeitos no cérebro e atenuar a potologia relacionada com a Doença de Alzheimer4.
Em humanos, o primeiro estudo incluiu 20 Pessoas com Défice Cognitivo Ligeiro amnésico ou em fases iniciais da Doença de Alzheimer. Os participantes foram avaliados antes e após a aplicação de tACS gama real ou simulada no pré-cúneos. Observou-se após a estimulação real, uma melhoria significativa na memória episódica, além de outros benefícios. Para além da melhoria na cognição, também houve uma reposição na conectividade colinérgica nos circuitos de memória5.
O mesmo grupo de investigadores, ampliou a experiência a 60 Pessoas com Doença de Alzheimer, utilizando um design experimental que permitiu eliminar o viés e o efeito placebo. Os participantes também foram avaliados antes e após 60 minutos de aplicação de tACS gama no pré-cuneos. Os resultados demonstraram, uma melhoria significativa na memória episódica (recuperação imediata e diferida), bem como na transmissão colinérgica6. Também, um outro grupo de investigadores, avaliou o efeito da tACS gama em 13 Pessoas com Défice Cognitivo Ligeiro amnésico. Os participantes que receberam oito sessões de 60 minutos de tACS gama a 40 Hz em áreas relacionadas com o processamento da memória episódica, melhoraram o seu desempenho7.

Recentemente, uma revisão sistemática sobre o impacto da tACS gama na memória em Pessoas com Défice Cognitivo Ligeiro ou Doença de Alzheimer, evidenciou resultados promissores na melhoria dos processos cognitivos e de memória, confirmando assim, o potencial das ondas gama como ferramenta de intervenção independente ou combinada com intervenções farmacológicas ou comportamentais8.
Para além dos efeitos na cognição, a tACS gama a 40 Hz também parece ter um efeito favorável sobre Doença de Alzheimer pois reduz a carga cerebral de proteínas anómalas acumuladas (tau e Beta amiloide) e melhora a perfusão cerebral de regiões estrategicamente vinculadas à memória (hipocampo), o que poderia significar um duplo efeito: sintomático e modificador da progressão da doença 9,10,11.
Neste sentido, os resultados dos estudos têm vindo a demonstrar que a terapia de indução gama pode reduzir a perda de conectividade funcional e a atrofia cerebral, enquanto melhora a função cognitiva e atenua vários marcadores patológicos da doença12.
Ainda que estas investigações estejam ainda no seu início, os resultados sugerem que a terapia baseada em tACS gama aplicada no pré-cúneos, pressupõe uma nova e promissora era na investigação da Doença de Alzheimer, e é por isso que os investigadores da NeuroVida, com o apoio e participação da Universidade Católica Portuguesa, iniciaram em 2020 um projeto de investigação para avaliar a sua eficácia em patologias cognitivas de origem degenerativa, introduzindo toda a tecnologia necessária para a aplicação e avaliação de tACS no continuum da Doença de Alzheimer.
Referencias:
- NPJ Science of Learning ; 2023: 8:1
- Nature Neuroscience 25 : 1237-1246 , 2022
- Transl. Med. 15, eabo2044 ; 2023
- Nature 07; 540, 7632: 230-235,2016
- Brain stimulation 14, 3, 531-540, 2021
- Ann Neurol 92:322–334, 2022
- Brain Stimulation 16 : 748-755, 2023
- Neuron, 102, 5 (5), 929–943, 2019,
- J Alzheimers Dis. ; 85(4): 1667-1676, 2022
- Front Aging Neurosci . 15;14: 980636, 2022
- Alzheimer’s Research & Therapy 13:203, 2021
- Neuropsychology Review , s11065-023-09589-0, 2023 (in advance)