Dislexia – Caracterização, Sinais de Alerta, Avaliação e Intervenção

A Dislexia é uma Perturbação do Neurodesenvolvimento, que se caracteriza por dificuldades significativas na precisão ou fluência no reconhecimento de palavras e nos processos ortográficos, as quais não são resultantes de dificuldade intelectual, alterações sensoriais, perturbações neurológicas ou motoras, absentismo escolar, desvantagem económica ou ambiental (Peterson & Pennington, 2015). Assim, os indivíduos com Dislexia apresentam um conjunto significativo de dificuldades específicas no reconhecimento de palavras (precisão), na descodificação de pseudopalavras, na fluência (leitura rápida, precisa e com adequada compreensão) e nos processos ortográficos.

Adicionalmente, constatam-se alterações na escrita que incluem erros fonológicos, ortográficos/lexicais e gramaticais bem como dificuldades nos processos cognitivos subjacentes à composição textual, com repercussões negativas no desempenho académico e profissional (Afonso, Suarez-Coalla, & Cuetos, 2015).

Em termos etiológicos, a Dislexia é caracterizada como “uma dificuldade de aprendizagem específica de origem neurobiológica” (Lyon et al., 2013). Nas últimas décadas, vários estudos com indivíduos disléxicos têm consistentemente demonstrado a presença de alterações no hemisfério esquerdo (Norton et al., 2015; Richlan e colaboradores, 2009; Shaywitz et al., 2006), e com recurso a Ressonâncias Magnéticas Funcionais identificaram as áreas do córtex comprometidas nestes indivíduos, durante a realização de tarefas que implicavam leitura (palavras e pseudopalavras) ou processamento fonológico (tarefa de rima de pseudopalavras).

Com base nas evidências científicas sobre a natureza neurobiológica e neurocognitiva da Dislexia, o DSM-5 (Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais – 5ª Edição) inclui esta perturbação no grupo das Perturbações do Neurodesenvolvimento, considerando-a enquanto uma “perturbação de origem neurobiológica que estará na base das alterações observadas a nível cognitivo e, consequentemente, às diversas manifestações sintomatológicas na leitura e escrita”.

Estudos correlacionais, longitudinais e de neuroimagem recentes comprovaram que os défices no processamento fonológico, definido como a perceção, retenção, compreensão e produção da linguagem oral e escrita (Catts, Fey, Zhang, & Tomblin, 1999) são o principal preditor e o mais importante denominador comum da Dislexia (Flecther, 2009; Norton et al., 2015; Peterson & Penningto, 2015; Ramus et al., 2003; S.E. Shaywitz, 2003; Snowling, 2000; Vellutio, Fletcher, Snowling, & Scanlon, 2004). Para além disso, estudos nacionais demonstraram um significativo compromisso da consciência fonológica e da nomeação rápida em crianças disléxicas portuguesas (Araújo et al., 2010; Moura et al., 2017; Moura, Moreno, et al., 2015; Sucena et al., 2009), alterações inesperadas para as capacidades cognitivas.

A relação entre leitura e desenvolvimento do vocabulário é recíproca, uma vez que a leitura promove o desenvolvimento do vocabulário e este facilita a compreensão do material escrito. Crianças com Dislexia tendem a ler menos pois a sua leitura é pouco precisa e fluente, o que implica um desenvolvimento mais lento do vocabulário bem como inibe uma adequada leitura e compreensão leitora. Assim, a Dislexia pode incluir problemas na compreensão da leitura e uma reduzida experiência leitora, as quais condicionam o desenvolvimento do vocabulário e conhecimentos gerais (Lyon et al., 2003).

O DSM-5 estima que 5% a 15% das crianças apresentam um Perturbação de Aprendizagem Específica, sendo que estudos em Portugal constataram uma prevalência da Dislexia de 5,4% em crianças do 1ºciclo (Sucena e Viana, 2011). Adicionalmente, diversos estudos epidemiológicos observaram uma predominância da Dislexia no género masculino e entre elementos da mesma família, sugerindo a hereditariedade desta perturbação. É, ainda, frequente observar-se uma relação comórbida entre a Dislexia e outras Perturbações do Neurodesenvolvimento (nomeadamente, PHDA e Discalculia).

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Uma vez que, a aprendizagem da leitura é um processo complexo e multifacetado, é de esperar que a sua perturbação envolva o prejuízo de diversas áreas cognitivas. Assim, pode ser classificada em função das alterações na leitura, no processamento fonológico ou no perfil neurocognitivo pautado por um único défice ou défices múltiplos.

Existem sinais de alerta que indicam que podemos estar perante uma dislexia, sendo eles:

  • Na leitura – dificuldades de automatização do processo de leitura; leitura lenta, silabada e com erros; precisão e velocidade inferiores ao esperado para a faixa etária e nível de escolaridade; dificuldades nas palavras irregulares e/ou pouco frequentes; dificuldades na compreensão de textos; alterações no processamento fonológico; alterações na descodificação de sons semelhantes (nh/lh, f/v, s/z, etc) e/ou inversão de silabas (ai/ia, per/pre); substituição de palavras por outras de estrutura similar, com significado diferente (saltou-salvou) e/ou substituição de palavras inteiras por outras semanticamente próximas (cão-gato; bonito-lindo; carro-automóvel).
  • Na escrita – dificuldades na associação fonema/grafema, principalmente em letras com sonoridade ou desenho parecidos; erros ortográficos e/ou fonológicos; unir ou separar palavras de forma indevida; repetição ou alterações no sítio das letras ou silabas dentro da palavra; omissão ou adição de letras e silabas; dificuldades na escrita de um texto coerente e coeso; caligrafia alterada.
  • Comportamentais – demora na realização de trabalhos; recusa em realizar tarefas de leitura ou escrita; facilidade em distrair-se; tempo de concentração reduzido; resultados académicos inferiores à capacidade cognitiva e ao nível de empenho; melhores resultados em tarefas orais do que escritas; dificuldade em aprender novas línguas; oposição e desobediência com as figuras de autoridade; isolamento ou anulação no ambiente escolar; inibição ou nervosismo sempre que tem de se expor.
  • Emocionais – ansiedade nos momentos em que tem de ler ou escrever; tristeza, frustração ou vergonha quando não atinge os objetivos pretendidos; fraca autoestima e pouca confiança em si próprio; alterações no sono.
    Deste modo, é importante que, caso o seu filho ou aluno revele algum dos sinais mencionados, seja reencaminhado para avaliação por uma equipa multidisciplinar, nomeadamente, avaliação neuropsicológica, por Terapia da Fala, Terapia Ocupacional ou Psicologia Clínica.

 

Na NeuroVida dispomos de uma equipa multifacetada e experiente, que poderá ajudar no processo de avaliação para caracterização das dificuldades de aprendizagem. Para além disso, dispomos de estudos neurofisiológicos (Eletroencefalograma com Mapeamento Cerebral) que poderá auxiliar na definição diagnóstica e proposta de intervenção.

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Com base nos resultados da avaliação realizada, a nossa equipa elabora um plano de intervenção adaptado e individualizado às dificuldades do seu filho(a) de forma a ajudá-lo(a) a superar essas dificuldades e a obter melhores resultados académicos e uma experiência académica mais feliz.

Referências Bibliográficas:


Afonso, O., Suárez-Coalla, P., & Cuetos, F. (2015). Spelling impairments in Spanish dyslexic adults. Frontiers in Psychology, 6(466), 1-10.

American Psychiatric Association (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th Edition). Washington, DC: American Psychiatric Publishing.

Araújo, S., Pacheco, A., Faísca, L., Petersson, K.M., & Reis, A. (2010). Visual rapid naming and phonological abilities: Different subtypes in dyslexic children. International Journal of Psychology, 45(6), 443-452.

Catts, H.W., Fey, M.E., Zhang, X., & Tomblin, J.B. (1999). Language basis of reading and reading disabilities: Evidence from a longitudinal investigation. Scientific Studies of Reading, 3(4), 331-361.

Fisher, S.E., & DeFries, J.C. (2002). Developmental dyslexia: Genetic dissection of a complex cognitive trait. Nature Reviwes Neuroscience, 3(10), 767-780.

Fletcher, J.M. (2009). Dyslexia: The evolution of a scientific concept. Journal of International Neuropsychology Society, 15(4), 501-508.

Lyon, G.R., Shaywitz, S.E., & Shaywitz, B.A. (2003). Defining dyslexia, comorbidity, teachers’ knowledge of language and reading: A definition of dyslexia. Annals of Dyslexia, 53(1), 1-14.

Morgan, A.E., & Hynd, G.W. (1998). Dyslexia, neurolinguistic ability, and anatomical variation of the planum temporale. Neuropsychology Review, 8(2), 79-93.

Moura, O., Moreno, J., Pereira, M., & Simões, M.R. (2015). Developmental dyslexia and phonological processing in European Portuguese orthography. Dyslexia, 21(1), 60-79.

Moura, O., Pereira, M., Alfaiate, C., Fernandes, E., Fernades, B., Nogueira, S., et al. (2017). Neurocognitive functioning in children with developmental dyslexia and attention-deficit/hyperactivity disorder: Multiple deficits and diagnostic accuracy. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 39(3), 296-312.

Norton, E.S., Beach, S.D., & Gabriel, J.D.E. (2015). Neurobiology of dyslexia. Current opinion in Neurobiology, 30, 73-78.

Peterson, R.L., & Pennington, B.F. (2015). Developmental dyslexia. Annual Review of Clinical Psychology, 11(1), 283-307.

Ramus, F., Rosen, S., Dakin, S.C., Day, B.L., Castellote, J.M., White, S., & Frith, U. (2003). Theories of developmental dyslexia: Insights from a multiple case study of dyslexic adults. Brain, 126(4), 841-865.

Richlan, F., Kronbichler, M., & Wimmer, H. (2009). Functional abnormalities in the dyslexic brain: A quantitative meta-analysis of neuroimaging studies. Human Brain Mapping, 30(10), 3299-3308.

Shaywitz, B.A., Lyon, G.R., & Shaywitz, S.E. (2006). The role of functional magnetic resonance imaging in understanding reading and dyslexia. Developmental Neuropsychology, 30(1), 613-632.

Shaywitz, S.E., (2003). Overcoming dyslexia: A new and complete science-based program for reading problems at any level. Nova Iorque: Vintage Books.

Snowling, M. (2000). Dyslexia. Oxford: Blackwell.

Sucena, A., Castro, S.L., & Seymour, P. (2009). Developmental dyslexia in an ortography of intermediate depth: The case of European Portuguese. Reading and Writing, 44(4), 358-371.

Vellution, F.R., Fletcher, J.M., Snowling, M., & Scanlon, D.M. (2004). Specific reading disability (dyslexia): What have we learned in the past four decades? Journal of Child Psychology and Psychiatry, 45(1), 2-40.

Sobre o Autor

A NeuroVida é uma instituição médica de neurologia e neurociências, pioneira em Portugal, que presta atenção integrada e interdisciplinar de cuidados a doentes do foro neurológico e neuropsiquiátrico. 

A clínica conta com uma equipa de especialistas em diversas áreas interdisciplinares liderada pelo Dr. Lázaro Álvarez, neurologista e neurocientista com mais de 30 anos de experiência.

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