A Importância da Estimulação das Funções Executivas na Dislexia

A dislexia é uma dificuldade de aprendizagem específica reconhecida por um padrão persistente de alterações na aprendizagem da leitura e escrita, caracterizadas por dificuldades no reconhecimento preciso e/ou fluente das palavras, dificuldades na ortografia e diminuição da capacidade de descodificação (International Dyslexia Association, 2020). Estas dificuldades manifestam-se como uma discrepância entre as capacidades cognitivas da criança e o seu desempenho ao nível das competências académicas, mais especificamente da leitura e da escrita.

Para além das perturbações da linguagem de que resultam as dificuldades de leitura e escrita, é comum que as crianças com dislexia apresentem défices noutras áreas de funcionamento cognitivo. Alterações da memória verbal e das funções executivas (Riccio, Sullivan & Cohen, 2010), nomeadamente ao nível da memória de trabalho, controlo inibitório, alternância, resolução de problemas, capacidade de iniciativa e velocidade de processamento, são frequentemente encontradas na avaliação formal do funcionamento executivo (Reiter, Tucha & Lange, 2004) e sugeridas pela análise das respostas a questionários a pais e professores (Akyurek & Bumin, 2019).

No entanto, sendo a leitura e a escrita processos complexos envolvendo diversas competências, naturalmente crianças com dislexia apresentam diferentes padrões de dificuldades: podemos, por exemplo, ter leitores fluentes, mas pouco precisos; leitores precisos, mas pouco fluentes; leitores precisos e fluentes, mas com fracas capacidades de compreensão. Diferentes perturbações surgem também na avaliação das funções executivas: poderemos encontrar problemas na memória de trabalho verbal e controlo inibitório em alunos com alterações na descodificação e alunos com alterações ao nível da compreensão poderão ter maiores dificuldades ao nível do planeamento.

Uma das grandes dificuldades das crianças com dislexia encontra-se na compreensão do texto; o aumento do esforço para descodificar o código escrito reduz os recursos disponíveis para a compreensão leitora, pelo que podemos encontrar alunos com dislexia (especialmente os mais velhos), que aparentam ter uma competência de leitura normativa por apresentarem uma velocidade e uma precisão adequadas, mas que depois revelam grandes dificuldades em compreender o que leem, ou seja, a extraírem ideias do texto, identificar informação relevante, fazer inferências, etc… Nestes alunos mais velhos com dificuldades de compreensão leitora, é comum que os défices no funcionamento executivo, que estavam presentes já desde cedo, surjam apenas com a complexificação do ensino e das exigências académicas. (Denckla et al., 2013).

As funções executivas são igualmente importantes na escrita de texto: um aluno com alterações da capacidade de planeamento terá dificuldade na sua organização, quer ao nível da ordem dos acontecimentos na história como da organização das palavras e frases no espaço gráfico. Um modelo simplificado da escrita (Figura 1; Hebert, et al., 2018) demonstra isso mesmo: o topo da pirâmide representa a geração de textos que resulta das duas competências da base: as competências de transcrição e as funções executivas. Por sua vez, todo este processo é mediado pela memória de trabalho, ou seja, pela capacidade de reter e manipular informação durante o tempo necessário à realização da tarefa, já que os alunos necessitam de utilizar este recurso para conseguir manipular os sons e as letras que darão origem às palavras, assim como para gerar ideias e mantê-las em mente durante a produção textual. Desta forma, alunos pouco proficientes ou com dificuldades na escrita, necessitam de utilizar mais recursos de memória de trabalho na ortografia, tendo menos recursos para a organização do texto (resultando muitas vezes em textos desorganizados e pouco coerentes).

Produção de Textos

A abordagem tradicional na intervenção na dislexia, de uma forma geral, centra-se na reeducação e estimulação das competências de leitura e escrita. No entanto, sabendo-se que as funções executivas se encontram prejudicadas na dislexia, também elas devem ser alvo de intervenção. De facto, algumas das dificuldades sentidas pelos alunos com esta patologia devem-se às alterações de funcionamento executivo mais do que a alterações da capacidade de descodificação e conversão fonema-grafema ou da consciência fonológica.

 

Desta forma, uma abordagem integrada de intervenção na dislexia deve centrar-se não só nas dificuldades de leitura e escrita em si, como nas alterações de linguagem e cognitivas que acompanham estas competências. A intervenção na dislexia deve, portanto, partir de uma avaliação pormenorizada, onde é estabelecido o perfil de funcionamento neurocognitivo da criança ou jovem, assim como identificadas as dificuldades específicas ao nível das competências académicas base. O plano terapêutico deverá refletir os resultados desta avaliação e seguir uma ordem hierárquica: a mesma ordem pela qual as funções executivas se organizam e complementam. Os défices nas funções executivas são frequentes na dislexia e provocam dificuldades que não são colmatadas com o treino direto da leitura e da escrita, pelo que a inclusão destas funções no plano terapêutico é fundamental. 

Sobre o Autor

A NeuroVida é uma instituição médica de neurologia e neurociências, pioneira em Portugal, que presta atenção integrada e interdisciplinar de cuidados a doentes do foro neurológico e neuropsiquiátrico. 

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